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Resenha: "Cujo", de Stephen King

  • Alessandro Yuri
  • 17 de jun. de 2017
  • 3 min de leitura



Resenha: Cujo, de Stephen King

Editora: Objetiva/Suma de Letras

Número de páginas: 373

Stephen King gosta de provocar intensas sensações nos leitores, principalmente o terror e o horror. Mas apesar de ser um leitor experiente de King, eu não esperava nada parecido com Cujo. Posso afirmar com todas as letras que este é o romance mais angustiante do autor. Em nenhum outro, o leitor ficará tão tenso em algumas passagens, e até mesmo torcerá para que o sofrimento intenso de uma personagem chegue ao fim.

Cujo é ambientado na cidade fictícia de Castle Rock, cinco anos, após uma série de terríveis crimes que lá ocorreram e que deixaram marcas emocionais profundas em seus moradores - evento descrito em A Zona Morta. King adota em Cujo um tom irônico de narração, como se fosse um conto de fadas, iniciando-o com o típico Era uma vez... Assim, somos apresentados à uma típica família americana, os Trenton formada pelo pai, Vic um publicitário bem-sucedido, sua esposa bonita e jovem, Donna, e o filho do casal, o pequeno Tad que fica apavorado todas às noites, pois ele acredita que existe um monstro escondido em seu closet. Dessa forma, King aos poucos demonstra que o harmonioso ambiente doméstico da família Trenton aos poucos é invadido por forças exteriores malignas, que ameaçam destruí-la – tema também habilmente explorado pelo autor em O Iluminado e O Cemitério, que junto com Cujo parece formar uma espécie de trilogia.

Paralelamente, também somos introduzidos na rotina de outra família, os Camber. O pai Joe é agressivo e costuma bater na mulher quando sua autoridade é desafiada. Eles têm um filho Bert, que a cada dia, para tristeza de Charity, a mãe fica mais parecido com o pai, e também um cachorro chamado Cujo, o principal protagonista do romance de King. Digo protagonista porque apesar de ser um cachorro, - um enorme São Bernardo-, Cujo expressa seus pensamentos e emoções.

Na parte inicial do livro, King o descreve com um cachorro como outro qualquer, que gosta de fazer traquinagens, sendo a sua preferida a de caçar coelhos. É em uma dessas brincadeiras inofensivas, que ocorre algo bem desagradável com o animal de estimação até então dócil e amigável, tornando-o agente de terror/horror em nessa obra.

Na trama de Cujo se configura o que podemos chamar de “sobrenaturalização do real”, - um artifício amplamente usado por King em seus principais textos-, de modo que o leitor não consiga saber qual a verdadeira causa da radical e abrupta mudança do comportamento do cão. Cujo não é somente uma boa história de horror e, assim como outras obras de King, diz muito sobre aspecto cultural dos Estados Unidos, em suas entrelinhas.

King por meio de sua escrita lança um olhar muito crítico sobre os americanos do interior de seu país, - ele nasceu no Maine, estado que faz parte dessa região-, no qual se destaca os caipiras grosseiros e com instintos animalescos e atávicos, que vivem em locais isolados e com aparência de total abandono. No romance, um deles, Joe é indiretamente responsável pela metamorfose degenerativa física e mental de Cujo. Dessa forma, o ser grotesco e monstruoso em que o cão se transforma pode ser compreendido como o lado primitivo e selvagem da América, no qual predomina impulsos à violência e a brutalidade.

Em Cujo o horror é descrito com matizes realistas, com alta carga de dramaticidade. É importante ressaltar que esse elemento surge da fragilidade das relações humanas, que assim como o cão podem assumir contornos assustadores e monstruosos. É no que existe de pior na natureza humana (ignorância, vilania, orgulho, ira, ódio, vingança, culpa) que se encontra a origem do mal que, posteriormente, se materializa sob a forma do cão monstruoso, que ameaça destruir totalmente os alicerces das famílias Trenton e Camber. É justamente a forma inovadora e até mesmo cruel como King descreve o sonho americano transformando-se em um terrível e angustiante pesadelo, que torna Cujo, um clássico do horror moderno e dos melhores romances do autor.


Cotação: ***** (excelente)


Obs.: a nova edição desse romance lançada pelo selo Suma de Letras está bastante caprichada. Ela tem capa dura, com arte impressa e folhas amareladas (padrão de qualidade que se assemelha a dos livros da editora Darkside). Nela o leitor também encontrará um material extra: uma interessante entrevista de Stephen King, em que o autor comenta um pouco sobre o processo de criação de Cujo e suas principais obras.



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